terça-feira, 4 de novembro de 2008

Espólio de Fernando Pessoa classificado património nacional


A obra de Fernando Pessoa vai ser classificada de património nacional, não podendo, por isso, sair do país.

A Biblioteca Nacional já começou a nacionalizar o espólio do poeta. Para a directora da Casa Pessoa esta é uma óptima notícia. Inês Pedrosa diz que não faz sentido que a obra pessoana esteja dispersa.

Já para os herdeiros de Pessoa, a classificação dos manuscritos do poeta, como património pessoal, é uma "ridicularia política", como avançaram à Lusa.


A directora da Casa Fernando Pessoa diz que não classificar o espólio pessoano seria como se o Governo não se preocupasse com os Jerónimos.

O ministério da Cultura já tinha lembrado aos herdeiros que existem mecanismos legais para que a obra de Pessoa não possa sair do país. Hoje a biblioteca nacional começou a nacionalizar o espólio pessoano.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

mais uma biografia de Pessoa

Seu pai, de ascendência judia, foi crítico musical do Diário de Notícias e faleceu em 1893. Sua mãe, de família açoriana, casou dois anos depois com o comandante João Miguel Rosa, cônsul de Portugal em Durban, na África do Sul. Nesta cidade sul-africana, Fernando Pessoa fez os estudos primários e secundários e freqüentou uma escola comercial. Em agosto de 1905, regressou a Lisboa, matriculando-se no Curso Superior de Letras, que freqüentou pouco tempo. Após uma fracassada tentativa no campo dos negócios, passou, em 1908, a assegurar sua subsistência fazendo correspondência estrangeira, sobretudo inglesa, para casas comerciais. Viveu num círculo muito restrito, fechado ao amor (namorou em 1920 uma datilógrafa) e sem ambições (recusou o convite para ensinar Língua e Literatura Inglesas na Universidade de Coimbra e deixou inédita a quase totalidade de sua gigantesca obra literária). Levou uma existência apagada, buscando a evasão na multiplicidade de suas criações literárias e no abuso do álcool, que lhe causou a cirrose hepática que o vitimou. De 1903 a 1909, compôs poemas em inglês e, em dezembro de 1904, fez sua estréia literária com um ensaio sobre Macauly, publicado na revista da Durban High School. Em 1912, iniciou sua colaboração na revista A Águia, órgão do saudosismo de Teixeira de Pascoaes. É de 1913 seu primeiro poema em português, intitulado "Pauis", que marca o início do modernismo nas letras portuguesas; em 1914, concebeu os heterônimos, sendo os principais Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis. Em abril de 1915, com Mário de Sá-Carneiro e Luís de Montalvor, lançou a revista Orpheu (da qual só foram editados dois números), que fez vingar o modernismo. Colaborou nas revistas Portugal Futurista (1917), Contemporânea (1922-1926), que dirigiu com José Pacheco, e Atena (1924-1925), de que foi diretor com Rui Vaz. Para concorrer ao Prêmio Antero de Quental, de um órgão oficial, publicou seu único livro de poemas em português, a que deu o nome Mensagem (1934): obteve o prêmio, mas na categoria B, porque o livro não atingiu o número de páginas requerido para a categoria A. Os escritos em prosa constam de ensaios estéticos e literários, textos filosóficos, páginas íntimas e cartas, salientando-se O Livro do Desassossego, atribuído ao semi-heterônimo Bernardo Soares. Sua obra poética, na maioria publicada postumamente, caracteriza-se por um absoluto predomínio da inteligência sobre a atrofia da vontade e do sentimento, inteligência que, para melhor exprimir a sua atitude perante a vida, recorreu à multiplicidade dos heterônimos, sendo estes, de fato, não as múltiplas facetas de um poeta dotado de uma compreensão englobante, mas a expressão de uma totalidade fragmentada sob a roupagem de múltiplos estilos personificados. Figura importantíssima do modernismo literário, ninguém como ele influenciou as gerações posteriores de poetas tanto em Portugal como no Brasil, ao mesmo tempo em que sua obra se afirmava progressivamente como uma das mais importantes da literatura do século XX.

Pessoa era contra o salazarismo e combateu-o

Simpatizante inicial do salazarismo, Fernando Pessoa distancia-se e empenha-se em combatê-lo, estando a expressão literária dessa luta patente num livro a lançar sexta-feira em Coimbra, por iniciativa do docente António Apolinário Lourenço.

«Contra Salazar», publicado pela Angelus Novus Editora, reúne em 146 páginas «tudo o que Fernando Pessoa escreveu contra Salazar», em poema, prosa e em cartas, surgindo agora ao público, quando se evocam os 120 anos do nascimento do poeta e 40 anos após o afastamento do ditador na sequência das sequelas da queda de uma cadeira, que iriam provocar a sua morte.

«A reunião de todos estes textos de Fernando Pessoa permite comprovar a profundidade e a radicalidade da oposição do poeta a António de Oliveira Salazar. Nessa oposição está patente o rancor pessoal, mas também a censura política contra o carácter ditatorial e fascizante do regime«, declarou à agência Lusa o docente da Faculdade de Letras de Coimbra, que este ano publicou também uma edição anotada de »Mensagem«.
Segundo o organizador da colectânea, »o primeiro sinal de distanciamento de Pessoa face ao regime saído do golpe militar de 28 de Maio de 1926 - que o poeta expressamente apoiara num opúsculo de 1928 - aparece em dois textos de 1930, que constituem a sua resposta à constituição da União Nacional«.

A ruptura - acrescenta - acentua-se com a publicação em 4 de Fevereiro de 1935, no Diário de Lisboa, de um artigo de Fernando Pessoa, intitulado »Associações Secretas«, em que o poeta manifesta a sua oposição a um projecto de lei do deputado José Cabral, apresentado na Assembleia Nacional, que visava a proibição da Maçonaria.

Noutros trechos da obra, Pessoa afirma que »o argumento essencial contra uma ditadura é que ela é ditadura«. Num outro reprova o facto de Salazar ter transformado uma ditadura à Primo de Rivera numa ditadura à Mussolini; ou outro ainda em que se queixa de ter sido vítima de um acto de censura.

Estou cansado da inteligência

Estou cansado da inteligência.
Pensar faz mal às emoções.
Uma grande reacção aparece.
Chora-se de repente, e todas as tias mortas fazem chá de novo
Na casa antiga da quinta velha.
Pára, meu coração!
Sossega, minha esperança fictícia!
Quem me dera nunca ter sido senão o menino que fui…
Meu sono bom porque tinha simplesmente sono e não ideias que esquecer!
Meu horizonte de quintal e praia!
Meu fim antes do princípio!

Estou cansado da inteligência.
Se ao menos com ela se apercebesse qualquer coisa!
Mas só percebo um cansaço no fundo, como baixam na taça
Aquelas coisas que o vinho tem e amodorram o vinho.



18 - 6 - 1930

cul de lampe

Pouco a pouco,
Sem que qualquer coisa me falte,
Sem que qualquer coisa me sobre,
Sem que qualquer coisa esteja exactamente na mesma posição,
Vou andando parado,
Vou vivendo morrendo,
Vou sendo eu através de uma quantidade de gente sem ser.
Vou sendo tudo menos eu.
Acabei.

Pouco a pouco,
Sem que ninguém me falasse
(Que importa tudo quanto me tem sido dito na vida?)
Sem que ninguém me escutasse
(Que importa quanto disse e me ouviram dizer?)
Sem que ninguém me quisesse
(Que importa o que disse quem me disse que queria?),
Muito bem…
Pouco a pouco,
Sem nada disso,
Sem nada que não seja isso,
Vou parando,
Vou parar,
Acabei

Qual acabei!
Estou farto de sentir e de fingir em pensar,
E não acabei ainda.
Ainda estou a escrever versos.
Ainda estou a escrever.
Ainda estou.

(Não, não vou acabar
Ainda…
Não vou acabar.
Acabei.)

Subitamente, na rua transversal, uma janela no alto e que vulto nela?
E o horror de ter perdido a infância em que ali não estive
E o caminho vagabundo da minha consciência inexequível.

Que mais querem? Acabei.
Nem falta o canário da vizinha, ó manhã de outro tempo,
Nem o som (cheio de cesto) do padeiro na escada
Nem os pregões que não sei já onde estão —
Nem o enterro (ouço as vozes) na rua,
Nem o trovão súbito da madeira das tabuinhas de defronte no ar de verão,
Nem… quanta coisa, quanta alma, quanto irreparável!
Afinal, agora, tudo cocaína…
Meu amor infância!
Meu passado bibe!
Meu repouso pão com manteiga boa à janela!
Basta, que já estou cego para o que vejo!
Arre, acabei!
Basta!

2 - 7 - 1930

In Poesia , Assírio & Alvim, ed. Teresa Rita Lopes, 2002

Ah, os primeiros minutos dos cafés de novas cidades!

Ah, os primeiros minutos dos cafés de novas cidades!
A chegada pela manhã a cais ou a gares
Cheios de um silêncio repousado e claro!
Os primeiros passantes nas ruas das cidades a que se chega…
E o som especial que o correr das horas tem nas viagens…

Os ómnibus ou os eléctricos ou os automóveis…
O novo aspecto das ruas de novas terras…
A paz que parecem ter para a nossa dor
O bulício alegre para a nossa tristeza
A falta de monotonia para o nosso coração cansado!...
As praças nitidamente quadradas e grandes,
As ruas com as casas que se aproximam ao fim,
As ruas transversais revelando súbitos interesses,
E através disto tudo, como uma coisa que inunda e nunca transborda,
O movimento, o movimento
Rápida coisa colorida e humana que passa e fica…

Os portos com navios parados,
Excessivamente navios parados,
Com barcos pequenos ao pé, esperando…

A rapariga inglesa

A rapariga inglesa, tão loura, tão jovem, tão boa
Que queria casar comigo…
Que pena eu não ter casado com ela…
Teria sido feliz
Mas como é que eu sei se teria sido feliz?
Como é que eu sei qualquer coisa a respeito do que teria sido
Do que teria sido, que é o que nunca foi?

Hoje arrependo-me de não ter casado com ela,
Mas antes que até a hipótese de me poder arrepender de ter casado com ela.

E assim é tudo arrependimento,
E o arrependimento é pura abstracção.
Dá um certo desconforto
Mas também dá um certo sonho…

Sim, aquela rapariga foi uma oportunidade da minha alma.
Hoje o arrependimento é que é afastado da minha alma.
Santo Deus! que complicação por não ter casado com uma inglesa que já
me deve ter esquecido!...
Mas se não me esqueceu?
Se (porque há disso) me lembra ainda e é constante
Escuso de me achar feio, porque os feios também são amados
E às vezes por mulheres!)
Se não me esqueceu, ainda me lembra.

Isto realmente, é já outra espécie de arrependimento.
E fazer sofrer alguém não tem esquecimento.

Mas, afinal, isto são conjecturas da vaidade.
Bem se há-de ela lembrar de mim, com o quarto filho nos braços,
Debruçada sobre o Daily Mirror a ver a Princesa Maria.

Pelo menos é melhor pensar que é assim.
É um quadro de casa suburbana inglesa,
É uma boa paisagem íntima de cabelos louros,
E os remorsos são sombras…
Em todo o caso, se assim é, fica um bocado de ciúme.
O quarto filho do outro, o Daily Mirror na outra casa.
O que podia ter sido…
Sim, sempre o abstracto, o impossível, o irreal mas perverso —
O que podia ter sido.
Comem marmelada ao pequeno-almoço em Inglaterra…
Vingo-me em toda a burguesia inglesa de ser um parvo português.

Ah, mas ainda vejo
O teu olhar realmente tão sincero como azul
A olhar como uma outra criança para mim…
E não é com piadas de sal do verso que te apago da imagem
Que tens no meu coração;
Não te disfarço, meu único amor, e não quero nada da vida.

Qualquer coisa de obscuro permanece

Qualquer coisa de obscuro permanece
No centro do meu ser. Se me conheço,
É até onde, por fim mal, tropeço
No que de mim em mim de si se esquece.

Aranha absurda que uma teia tece
Feita de solidão e de começo
Fruste, meu ser anónimo confesso
Próprio e em mim mesmo a externa treva desce.

Mas, vinda dos vestígios da distância
Ninguém trouxe ao meu pálio por ter gente
Sob ele, um rasgo de saudade ou ânsia.

Remiu-se o pecador impenitente
À sombra e cisma. Teve a eterna infância,
Em que comigo forma um mesmo ente.

Fernando Pessoa

Não sei o que ter possa de verdade

Não sei o que ter possa de verdade
Do visto mundo a não-verdade triste
Ou que fruto, na planta em flor, resiste
Desconhecido até à realidade.

Como arco-íris que da chuva atravessa
Terra e céu frescos, após a bonança,
Real ou não, já cruza a esperança
O momento da nossa dor que cessa.

Mas se a dor real como mal é tida
Na esp'rança temos um melhor penhor;
Já que não devia a dor ser sentida,

P'ra procurar o homem tem motivo,
Se o Tempo se mede por idade e dor,
Que os prazeres do Tempo um melhor abrigo.

Fernando Pessoa, Poesia Inglesa, in Poemário, Assírio e Alvim

Literatura: I Congresso Internacional Fernando Pessoa encerra comemorações dos 120 anos do poeta

Lisboa, 17 Out (Lusa) - A Casa Fernando Pessoa realiza de 25 a 28 de Novembro, em Lisboa, o I Congresso Internacional Fernando Pessoa, uma iniciativa que criará um diálogo entre especialistas na obra do escritor e poetas, pintores e cineastas que nela se inspiram.

O ensaísta Eduardo Lourenço vai proferir a conferência inaugural neste congresso que encerra as comemorações dos 120 anos do autor do "Livro do Desassossego".

"Os segredos revelados pelas anotações marginais de Pessoa à sua própria biblioteca, os pontos de contacto entre a obra de Pessoa e a de outros génios da literatura (como o Padre António Vieira, Shakespeare, Joyce ou Yeats), as relações entre Pessoa e a psicanálise ou as suas ligações à astrologia serão outros temas abordados neste Congresso", indica uma nota da Casa Fernando Pessoa.

O Congresso, que vai decorrer no Auditório do Turismo de Lisboa, contará com as participações de Antonio Cicero, Arnaldo Saraiva, Fernando Cabral Martins, Fernando Pinto do Amaral, Jerónimo Pizarro, Ivo Castro, João Botelho, José Blanco e Júlio Pomar.

Nuno Júdice, Paulo Cardoso, Fernando J.B. Martinho, Antonio Saéz Delgado, Richard Zenith, Manuela Nogueira e Teresa Rita Lopes são outros dos participantes.

O Congresso inclui ainda um espectáculo de Camané que vai cantar fados com poemas de Pessoa.

Fernando Pessoa nasceu em Junho de 1888 e morreu em 1935.

EO.

Lusa/Fim

Congresso em Novembro encerra comemorações do nascimento do escritor


As comemorações dos 120 anos do nascimento do autor do «Livro do Desassossego» encerram com o I Congresso Internacional Fernando Pessoa, no Auditório do Turismo de Lisboa, Rua do Arsenal Nº 15, entre os dias 25 e 28 de Novembro

A singularidade deste Congresso, promovido pela Casa Fernando Pessoa, “é a de criar um diálogo entre os especialistas da obra de Pessoa e os criadores que nela se inspiram – poetas, pintores, cineastas”.

O professor Eduardo Lourenço proferirá a conferência inaugural, às 10h30 de dia 25 de Novembro.

Os segredos revelados pelas anotações marginais de Pessoa à sua própria biblioteca, os pontos de contacto entre a obra de Pessoa e a de outros génios da literatura (como o Padre António Vieira, Shakespeare, Joyce ou Yeats), as relações entre Pessoa e a psicanálise ou as suas ligações à astrologia serão outros temas abordados neste Congresso.

Entre os muitos congressistas portugueses e estrangeiros que se deslocam para este encontro, destacam-se as presenças de Antonio Cicero, Antonio Saéz Delgado, Anna Klobucka, Arnaldo Saraiva, Eucanaã Ferraz, Fernando Cabral Martins, Fernando J.B. Martinho, Fernando Pinto do Amaral, Gastão Cruz, Ivo Castro, Jerónimo Pizarro, João Botelho, José Blanco, José Gil, Júlio Pomar, Ken Krabbennhoft, Leyla Perrone-Moisés, Manuela Nogueira, Maria Lúcia Dal Farra, Nuno Júdice, Paulo Cardoso, Patrick Quillier, Richard Zenith, Robert Bréchon e Teresa Rita Lopes.

O Congresso incluirá ainda um espectáculo de Camané, composto unicamente por fados com poemas de Pessoa, e uma versão teatral de «A Carta da Corcunda ao Serralheiro», de Fernando Pessoa, numa interpretação de Ângela Pinto.

TEMEC apresenta drama musical em Itu

Teatro Maestro Eliazar de Carvalho (TEMEC) apresentará, no dia 14 de novembro, às 20h30, um drama musical baseado no poema "Não Sei Quantas Almas Tenho" e as preliminares de "O Cancioneiro" de Fernando Pessoa.

A peça traz um espetáculo visual, literal e musical. Vítima de transtornos de personalidade, Fernando Pessoa canta suas crises enquanto personifica seus heterônimos mais conhecidos sob o vago, o vazio e o translúcido de seu existencialismo.

A proposta visual mostra "o nada" de quem não tem uma identidade, preso no seu próprio "cubo emocional", sem saídas. A cor neutra contrasta com as sombras projetadas que representam suas múltiplas personalidades. São suas únicas companheiras num universo retilíneo, na linha reta de um "pensamento distorcido" em diferentes vertentes sobre a poesia, o drama e a música. A proposta musical são poesias cantadas por piano e voz clássico, composições para o espetáculo com influência de fados portugueses.

Objetivo Cultural e Pedagógico

O texto reúne uma antologia poética de Fernando Pessoa que de forma única é interpretada. A música estabelece mais um conceito de arte coadjuvante como trilha ao espetáculo, tornando-o mais dinâmico enquanto às interpretações dos personagens abordados. Assim, pode-se unir dois públicos e propostas específicas diferentes: o entretenimento de forma geral e o apoio educacional e base literária no que se refere ao assunto..

O TEMEC está localizado na rua Cuiabá, 61, bairro Brasil.

Pessoa na China: O blogue do desassossego



Número de Documento: 8965838

Pequim, China 03/11/2008 10:32 (LUSA)
Temas: Artes, Cultura e Entretenimento, Literatura, Internet
Pequim, 03 Nov (Lusa) - O nome de um dos mais conhecidos blogues chineses é inspirado numa passagem de "O Livro do Desassossego", obra de Fernando Pessoa que já teve cinco edições na China.

É "O oitavo continente de Lian Yue", distinguido o ano passado pela Deustsche Welle (Rádio da Alemanha) como "o melhor blogue chinês".

"Pessoa e Kafka são dos escritores estrangeiros que mais admiro", disse à agência Lusa o autor do blogue, Lian Yue.

E comparando os dois, acrescenta: "Pessoa é mais moderno e criativo".

Lian Yue, 38 anos, formado em literatura chinesa, contou que descobriu Pessoa através de uma tradução de "O Livro do Desassossego" publicada por uma editora de Xangai em 1999.

Trata-se de uma obra assinada pelo heterónimo Bernardo Soares e onde Pessoa afirma a certa altura: "Não é nenhuma das sete partidas do mundo aquela que me interessa e posso verdadeiramente ver; a oitava partida é a que percorro e é a minha".

(Na edição chinesa, feita a partir da versão inglesa e não directamente do português, a palavra "partida" foi traduzida por "continente").

"Pessoa é brilhante. É um autor fora do comum e que mostra a beleza do mundo", diz Lian Yue.

Pessoa - "Pei Suo A", em chinês - é também o único autor português que Lian Yue conhece: "Há poucas traduções de escritores portugueses. De Portugal, o que se conhece melhor na China é o futebol".

O blogue de Lian Yue destacou-se em 2007 pela sua campanha contra a construção de uma fábrica de produtos químicos em Xiamen, que culminou com o cancelamento da obra, um resultado aclamado na blogosfera chinesa como "uma vitória da liberdade de expressão na China".

Em Março passado, a propósito das restrições impostas pelo governo chinês após os violentos incidentes no Tibete, "O oitavo continente de Lian Yue" proclamou que "qualquer poder que tente esconder informação deve ser encarado como um mau poder".

"A China é um país onde pessoas com sentimentos extremistas são os grandes apoiantes do poder e essas pessoas e esses sentimentos impedem o poder de se reformar a si próprio", afirmou Lian Yue.

Antigo jornalista do semanário Nanfang Zhoumo (Fim de Semana do Sul), um dos jornais mais irreverentes e populares da China, Lian Yue vive hoje dos artigos de opinião que assina em várias publicações.

"Não tenho problemas financeiros", diz.

Já publicou seis livros, entre os quais um romance e um ensaio sobre a Bíblia mas, em vez de escritor ou jornalista, prefere assumir-se como crítico social.

"Há vinte anos não havia espaço para criticar a sociedade. Hoje, o espaço é cada vez maior", afirma Lian Yue.



AC.

Lusa/Fim